"Não consigo ver
mais que isso: essa é a lembrança. Além dela, nós conversamos durante muito
tempo na chuva, até que ela parasse, e quando ela parou, você foi embora. Além
disso, não consigo lembrar mais nada, embora tente desesperadamente acrescentar
mais um detalhe, mas sei perfeitamente quando uma lembrança começa a deixar de
ser uma lembrança para se tornar uma imaginação. Talvez se eu contasse a alguém
acrescentasse ou valorizasse algum detalhe, assim como quem escreve uma
história e procura ser interessante - seria bonito dizer, por exemplo, que eu
sequei lentamente seus cabelos. Ou que as ruas e as árvores ficaram novas,
lavadas depois da chuva. Mas não direi nada a ninguém. E quando penso, não
consigo pensar construidamente, acho que ninguém consegue. Mas nada disso tem
nenhuma importância, o que eu queria te dizer é que chegando na janela, há
pouco, vi a chuva caindo e, atrás da chuva, difusamente, uma roda-gigante. E
que então pensei numas tardes em que você sempre vinha, e numa tarde em
especial, não sei quanto tempo faz, e que depois de pensar nessa tarde e nessa
chuva e nessa roda-gigante, uma frase ficou rodando nítida e quase dura no meu
pensamento. Qualquer coisa assim: depois daquela nossa conversa - depois
daquela nossa conversa na chuva, você nunca mais me procurou."
quinta-feira, 24 de junho de 2010
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